Késia Silva, de 28 anos, encontrou os materiais no quintal de seu pai, o agricultor Ciriaco Silva
Manaus (AM) – Três urnas, dentre elas, uma bem preservada, e fragmentos foram encontrados por uma moradora nas proximidades do município de Alvarães (distante 531 quilômetros de Manaus). Késia Silva, de 28 anos, encontrou os materiais no quintal de seu pai, o agricultor Ciriaco Silva, após dias intensos de chuva.
Em entrevista, a agricultora relatou que as fortes chuvas ajudaram na aparição das cerâmicas ancestrais. A jovem notou um pedaço do objeto pintado com uma borda na superfície da terra e resolveu pedir ajuda de seus familiares e vizinhos para desenterrar as peças.
“Eu logo percebi que isso não era uma coisa qualquer, me abaixei e falei para meu irmão que tratava-se de alguma peça indígena, então começamos a escavar. E na medida que fomos retirando, apareceram outros pedaços e outra urna ainda maior – todas com ossos humanos”, explicou Késia.
Sabendo da importância do material e do risco de os artefatos serem quebrados por crianças e/ou animais do sítio, a jovem decidiu retirar da terra os objetos com objetivo de preservar a peça e aguardar os órgãos interessados em avaliar as peças ancestrais.
Por esses dias, a família foi até a cidade de Tefé (distante 522 quilômetros de Manaus) procurar instruções sobre os novos achados arqueológicos, e então procurou o IFAM Campus Tefé, que em seguida direcionou a família até o Instituto Mamirauá, onde também receberam as primeiras instruções.
Ancestralidade e história no quintal
Aos 58 anos de idade, o agricultor Ciriaco da Silva diz nunca ter visto algo parecido de tão perto. Ciriaco confirma ser descendente de indígenas da região do médio Solimões e diz que logo que passou a morar, a partir dos anos 2000, nas proximidades de Alvarães, onde hoje tem sua casa, sentia uma energia diferenciada de outras regiões que morou. Após as escavações das urnas, o ribeirinho relatou que no dia seguinte, ao amanhecer, sentou-se na cadeira em frente sua casa e viu um clarão muito forte próximo de uma grande seringueira de seu quintal, nas proximidades onde foram encontradas as urnas.
Para o agricultor, que não estava em casa no dia da descoberta, foi uma surpresa se deparar com uma urna, descrita por ele como algo fascinante.
O fotógrafo amazonense Tácio Melo, que conheceu a família em Tefé e foi até o sítio do agricultor, percebeu que Ciriaco e sua família tiveram bastante cuidado ao desenterrar as urnas, ao ponto de terem conseguido retirar uma delas totalmente intacta. O fotógrafo notou também o grande cuidado que a família tem com os objetos, que agora são guardados em uma cabana ao lado da casa com as ossadas indígenas, a fim de preservar as urnas até a chegada de profissionais para serem avaliadas.
“Uma das urnas dá a impressão de que foram pintadas há alguns meses, de tão conservadas que estão. Em conversa com o sr. Ciriaco, notei que ele é uma pessoa que está valorizando sua história, sua ancestralidade, pois o mesmo confirma que seus avós eram indígenas, mas que, infelizmente, a cultura e a língua de seus avós não foram repassadas para ele. Mas ainda é possível notar o respeito e a gratidão que ele tem pelos seus ancestrais do médio Solimões”, relatou o fotógrafo.
Desdobramentos históricos
Para professora natural do Amazonas, arqueóloga Arminda Mendonça, que foi sócia-fundadora da Sociedade de Arqueologia Brasileira (SAB) e fundadora do primeiro curso de arqueologia da América do Sul, na Faculdade de Arqueologia e Museologia Marechal Rondon no Rio de Janeiro, a região norte do Brasil ainda é um lugar para muitas descobertas. Ela cita que apenas cerca de 10% do conhecimento sobre os povos originários e seus modos de vida no Amazonas é conhecido.
“Viajei por várias partes do Brasil e muitas regiões do Amazonas, entre os anos 70 até o início dos anos 2000, e dessa experiência só tenho a dizer que temos, no Amazonas, a maior população étnico regional do mundo. Com essa floresta gigante, é inimaginável o que ainda temos para descobrir. Das expedições com descrições, como a de Carvajal, que descreviam inúmeras ocas indígenas nas beiras dos rios (que pode ser um pouco de exagero, mas verídico), até aos relatos de dois séculos passados, é possível notar o quão grande eram as populações indígenas da nossa região. Hoje em dia, seja em Manaus, ou qualquer espaço contemplativo nas margens dos rios do nosso Amazonas, podem ser encontrados fragmentos dessas populações – é algo fantástico que me fascina”,
relata a arqueóloga já aposentada.
Ao longo dos anos, já foram encontrados diversos fragmentos e urnas indígenas na região do Médio Solimões, sendo estas descobertas por pesquisadores e alunos da UEA sob a coordenação da arqueóloga Arminda Mendonça, e nos anos mais recentes pelo Instituto de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá, que conta com vários especialistas que tem ajudado na conservação dos achados arqueológicos da Floresta Nacional de Tefé.
*Com informações da assessoria
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